”’Dall’Oglio não foi sequestrado. Ele suspendeu os contatos para negociar com os jihadistas”

Publicado em 01/08/2013 | Categoria: Notícias |


Nenhuma confirmação ou notícia sobre o sequestro do padre jesuíta. Rumores o descrevem envolvido em uma mediação para obter a liberação de uma equipe da televisão antirregime Orient, sequestrada há alguns dias perto de Aleppo. O Ministério das Relações Exteriores italiano afirma: “Neste momento, para nós ele está indetectável”.

A reportagem é do sítio do jornal La Repubblica, 31-07-2013. A tradução é de Moisés Sbardelotto.

O padre jesuíta italiano Paolo Dall’Oglio, desaparecido no norte da Síria desde domingo, “não foi sequestrado, mas suspendeu todo contato com o exterior no âmbito das negociações” que ele mantém com expoentes jihadistas da oposição. A afirmação é dos ativistas, nessa quarta-feira, que acompanharam o religioso na Síria.

Dall’Oglio, especificam os ativistas, entrou na Síria atravessando a fronteira da Turquia e, desde domingo, está envolvido nas negociações. O religioso tinha um encontro com Abu Bakr al Baghdadi, líder do Estado Islâmico do Iraque e do Levante, organização à qual está ligada o Fronte al Nusra, principal força jihadista da oposição síria.

Ele tinha anunciado que, por alguns dias, ele encerraria todo contato com o exterior. Ainda nessa terça-feira vários sites da oposição tinham circulado rumores de que o jesuíta estava envolvido em uma mediação para obter a liberação de uma equipe da televisão Orient, voz do fronte antirregime, sequestrada há alguns dias perto de Aleppo.

O padre Paolo Dall’Oglio tinha sido visto pela última vez em Raqqa, cidade síria controlada pelos rebeldes sírios. Jesuíta, conhecido por ser contrário ao regime de Damasco, tinha sido expulso do país onde vivia há 30 anos, mas havia voltado passando pelas áreas controladas por rebeldes, dos quais fazem parte grupos sunitas integralistas.

Segundo fontes da oposição, ele teria sido sequestrado por um grupo de milicianos ligados à Al Qaeda chamado “Estado Islâmico do Iraque e do Levante no Iraque”. Mas o Ministério das Relações Exteriores italiano ainda não confirmou. “No momento, ele permanece indetectável: é preciso fazer todo o possível para verificar a situação”, afirmaram as fontes do ministério, especificando que, por enquanto, não há novidades sobre a situação do sacerdote.

Um pensamento ao padre Paolo Dall’Oglio foi dirigido pelo Papa Francisco na homilia da manhã dessa quarta-feira na Igreja do Gesù, por ocasião da Festa de Santo Inácio. O pontífice recordou que os jesuítas são chamados de diversas formas a dar a sua vida pelos outros. “Eu penso – disse Francisco – no nosso irmão na Síria neste momento”.

Mas, também para o diretor da Sala de Imprensa do Vaticano, padre Federico Lombardi, não há nenhuma novidade. “Acompanhamos a situação com atenção. As vias ordinárias, da Nunciatura e da Companhia, não têm mais informações”, disse Lombardi. “É uma pessoa corajosa, informada do risco, conhece bem aqueles lugares. Estamos convencidos de que ele faz isso por motivos muito altos, ele sabe o que faz. Estamos perto dele espiritualmente, mas não temos informações específicas”.

Que o caso do sequestro é “anômalo” é o que pensa o padre Adolfo Nicolás, prepósito geral da Companhia de Jesus: “Não temos notícias diretas nem do provincial no Oriente Médio. Sabemos tudo dos jornais, mas não o que está por trás. É uma situação anômala”, disse. “Seria mais fácil de entender se um grupo pró-regime o tivesse sequestrado, porque o padre Dall’Oglio sempre falou em defesa da oposição”, acrescentou o padre Nicolás, reiterando que essa é “uma situação anômala da qual não sabemos o sentido”.

Enquanto isso, as tropas do governo lançaram um ataque para recuperar o controle do vilarejo de Khan al-Assal. Segundo os ativistas sírios, o centro habitado, que se encontra fora da cidade de Aleppo, foi capturado pelos rebeldes na semana passada. O Observatório Sírio pelos Direitos Humanos informou que o Exército trouxe reforços para a área e nessa quarta-feira atacou posições dos rebeldes fora do vilarejo, na aparente tentativa de reconquistá-lo.

Nota da IHU On-Line:

 

Se quiser conhecer mais sobre o Mosteiro de Mar Mussa, fundado por Paolo Dall’Oglio, veja o video, em árabe, legenda em inglês, com duração de 4,02min.

 

Leia também:

A carta do padre Dall’Oglio ao Papa Franciscopadre jesuita sequestrado

 

O padre Dall’Oglio, o jesuíta expulso da Síria pelo regime de Assad em 2012, havia escrito ao Papa Francisco há poucos dias para pedir-lhe uma iniciativa de paz.

A reportagem é do sítio da revista Famiglia Cristiana, 30-07-2013. A tradução é de Moisés Sbardelotto.

Eis o texto.

Meu nome é Paolo Dall’Oglio, sou jesuíta e por mais de 30 anos tenho promovido na Síria a harmonia islamo-cristã.

Tomei posição em favor dos democráticos sírios esmagados por uma repressão desumana e indiscriminada que eu esperava não ter que ver no século XXI. Fui expulso em junho de 2012 e, desde então, estou empenhado em tempo integral pela defesa dos direitos dos sírios e pela legitimidade da sua revolução.

Hoje, como sabemos, a Síria serve de ringue para uma luta geopolítica regional até a última gota de sangue. Em tudo isso, as Igrejas não souberam reagir a tempo, e os cristãos se encontram agora presos nas zonas de guerra e simplesmente tendem a deixar o país. Infelizmente, o regime sírio tem sido muito hábil em utilizar um número de eclesiásticos, homens e mulheres, para se propagandear no Ocidente como o único e último baluarte em defesa dos cristãos perseguidos pelo terrorismo islâmico.

Essa operação de manipulação da opinião foi bem sucedida para desacreditar em grande parte o esforço revolucionário sírio, in loco e no exterior, aos olhos dos cidadãos de todo o mundo e, portanto, conseguiu obter uma paralisia da diplomacia europeia e da política europeias, que, em última análise, só fortalece os grupos mais extremistas e enfraquece a sociedade civil. A forte e instrumental implicação das Igrejas na manipulação mentirosa sistemática do regime não pode deixar de exigir uma reação consciente e responsável por parte da Igreja Católica e, portanto, do papa de Roma.

O abaixo-assinado que eu apresento à sua atenção mostrará o rosto mais solidário e maduro da sociedade italiana e internacional e permitirá que o Papa Francisco supere as resistências do seu contexto, tendencialmente islamofóbico, embora muitas vezes de modo tipicamente sutil e indireto, e lance uma iniciativa diplomática própria, pedindo a intervenção de novos atores, latino-americanos por exemplo.

Esta minha e agora sua petição apresenta ao papa a necessidade de contrastar a atual sistemática utilização do regime pelos atores eclesiásticos mais importantes no Oriente Próximo, para olhar além, responder às expectativas de todos os sírios, que sofrem para obter a liberdade, e preparar um futuro positivo para aqueles cristãos que escolherem permanecer no país ou voltar para ele.

O abaixo-assinado ao Papa Francisco

“Estimado e caro Papa Francisco,

sabendo que o senhor é um amante da paz na justiça, pedimos-lhe que promova pessoalmente uma iniciativa diplomática urgente e inclusiva para a Síria, que assegure o fim do regime torturador e massacrador, salvaguarde a unidade na multiplicidade do país e permita, por meio da autodeterminação democrática assistida internacionalmente, a saída da guerra entre extremismos armados.

Pedimos com confiança que o Papa Francisco se informe pessoalmente sobre a manipulação sistemática da opinião católica no mundo por parte dos cúmplices do regime sírio, especialmente eclesiásticos, com a intenção de negar em essência a revolução democrática e justificar, com a desculpa do terrorismo, a repressão que cada vez mais adquire o caráter de genocídio”.

Pe. Paolo Dall’Oglio

 

Fonte: Unisinos



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