A voz do Pastor

Publicado em 04/03/2012 | Categoria: Notícias |


Dom José Francisco Rezende Dias


O Mistério de Cristo


A Quaresma chega devagar, quase, imperceptível, no burburinho da agitação do momento. Quando menos se vê, nos encontramos no coração da Quaresma e no coração da Páscoa. E aí, sim, mergulhados no coração do Mistério de Cristo – obediente em tudo ao Pai, até a morte, e morte de cruz (Fl 2,8). O coração do Mistério de Cristo é a obediência ao Pai. O coração da vida dos que o seguem é a obediência ao Filho. Pobreza sem obediência não passa de carência, castidade sem obediência pode tornar-se esterilidade. Sem a obediência, as duas escorregam para a vala comum do mero esforço social, incapaz de alcançar o patamar incomum da mística cristã: a Vida em Deus para os irmãos. Nem sacrifícios nem ofertas nem holocaustos. Porém, um ouvido aberto. E o peito de quem ouve pronuncia uma palavra: “Aqui estou para fazer a tua vontade!” (Sl 40) E nada mais é preciso, porque tudo foi dado. A Quaresma é a celebração da obediência do Filho, a Páscoa é o canto de vitória do Pai. Tudo o que não é dado é perdido. O Mistério do Filho foi sua doação total.

Essa é a razão de ser da Quaresma: aprofundar nossa vida na Vida e no Mistério de Cristo – doação total de si – escondido no Mistério de Deus – doação total em si. Escondido, sim. Porque esse é o jeito de Deus se revelar: para se revelar, Deus se esconde. “Ele é a imagem do Deus invisível” (Cl 1,15). “Ninguém jamais viu a Deus, quem nos revelou Deus foi o Filho, o único que está junto do Pai” (Jo 1,18). Porém, o Deus que se revela, se esconde; se esconde para se revelar. Esse é o grande paradoxo de Deus: Ele não faz marketing pessoal.

Acompanhem-me com o evangelista Marcos. Estaremos lendo Marcos durante todo o ano, nas leituras do Tempo Comum.

No Evangelho de Marcos, o Mistério de Jesus, o Filho de Deus, é revelado desde o início. É o próprio Deus quem o apresenta como Filho. Jesus acabou de sair das águas do Jordão, onde foi batizado, e se rasgam os céus, e se ouve uma voz: “Tu és meu Filho amado. Em ti encontro o meu agrado” (Mc 1,11). E eu pergunto: quem ouviu? Ninguém. Não havia ninguém, lá, naquela cena. A cena é grandiosa, mas não há espectadores. Grandiosa demais, para ninguém ver! O Mistério de Deus cresce em Jesus, sim, mas secretamente.

De novo, ouve-se a voz do Céu. Dessa vez, Jesus se encontra no alto de uma montanha onde ele se transfigura. A cena novamente é monumental: Nuvens e sombras se alternam. Marcos descreveu a grandiosidade do momento, dizendo que as roupas do transfigurado ficaram “tão brilhantes e brancas como nenhuma lavadeira do mundo conseguiria alvejar” (Mc 9,3). E quem viu? Quase ninguém. “Este é o meu Filho amado. Escutai-o” (Mc 9,7). Quem ouviu a voz? Apenas um círculo íntimo de três discípulos. É muita revelação para tão poucos receptores. Ao descer do monte, Jesus os adverte a não contarem a ninguém o que viram até que ele “ressuscite dos mortos” (Mc 9,9). Só, então, eles poderiam captar o seu mistério e confessá-lo.

Mas, aí, o que aconteceu naquele dia? Todos fugiram. Apenas algumas mulheres assistiram de longe. Apenas um centurião romano pagão presenciou a cena. Coube a ele, vendo Jesus expirar abandonado por todos, proclamar: “Verdadeiramente, este era mesmo o Filho de Deus!” (Mc 15,39). O Mistério de Deus revelado em Cristo Jesus não tem para quem ser revelado. É. Deus não faz marketing pessoal, mesmo!

No final, no clímax da História da Salvação, quando um jovem vestido de branco anuncia às mulheres que o quê elas buscam não pode ser encontrado ali, no túmulo vazio, o que elas fizeram? “Saíram do túmulo correndo, porque estavam com medo e assustadas. E não disseram nada a ninguém, porque estavam com medo” (Mc 16,8). Tudo o que precisava havia sido dito. Mas quem escutou? Quem escutará?

Essa é a grande razão da Quaresma: preparar-nos para escutar o que o Pai nos revela em seu Filho Jesus. É para isso que jejuamos, nos abstemos de prazeres comuns e perfeitamente viáveis, seguramos com rédea curta os nossos desejos e compulsões, dispensamos da nossa língua todo comentário desnecessário e infeliz. Para quê? Para nos lavarmos de nós mesmos nas águas do batismo de Jesus onde a voz se ouviu. Para reverter as imagens mentirosas que cultivamos de nós mesmos no jeito pleno de ser do Jesus transfigurado. Para nos desintoxicarmos de nossos egos inflados e caminhar com ele os últimos seiscentos metros que separaram a casa de Pilatos do monte da vergonha. E nem digo para estarmos na sua cruz, mas ao seu lado, pelo menos, e sem abandoná-lo, como fizeram os primeiros. Não vamos deixar a um centurião romano a última palavra e a glória de reconhecer, no último dos últimos, o Filho de Deus: nossa vida, nosso caminho, nossa paz.

Mas, não é fácil! Para enxergar o Mistério de Deus revelado em Cristo, precisamos ser curados. Precisamos daquilo que em latim se chamava “salus” e que se traduz em duas palavras: salvação e saúde. Precisamos da saúde de Deus, diferente da cura dos homens. Entre nós, a palavra “cura” precisa ser escrita entre aspas. Curar é um verbo muito grandioso para ser empregado entre os humanos. Quando muito, removemos sintomas. A cura, mesmo, por inteiro, é assunto de outra ordem.

O que não significa que não devamos esticar as mãos além do alcance dos braços para aliviar o sofrimento humano. A Campanha da Fraternidade deste ano nos alerta para essa urgência. É uma urgência que os doentes não sejam abandonados nas filas do serviço público de saúde. Trabalhar no empenho por políticas públicas no campo da saúde, também, é reconhecer o Mistério de Cristo escondido, lá, onde Ele esteve doente e foi visitado (Mt 25,36).

No entanto, com um olho vemos o que precisa ser visto, com outro alcançamos o que se esconde de nós. E o que se esconde de nós? É o Mistério de Cristo.

Há uma cena linda num filme chamado “O Manto Sagrado”. Um tribuno romano descobre os cristãos celebrando a ceia nas catacumbas. Encontra ali pessoas de todo nível social e não entende como aquilo possa acontecer. Ouve falar de milagres, mas não vê nenhum. Até que percebe uma jovem lindíssima cantando hinos, dirige-se até ela e vê que ela é cega. Pergunta-lhe por que ela se encontra ali, naquele lugar, e ouve, boquiaberto, a resposta: “Cristo me curou!” Mas curou de quê?, ele indaga. Ela ainda é cega! “Curou minha alma”, ela responde. E olha para ele, como se o visse, e lhe diz: “Ele pode curar a sua também”.

Rezo para nesta Quaresma todo nosso ser por inteiro seja curado de todas as mazelas. E, sobretudo, para que nos encontremos frente a frente com o Mistério de Cristo em nossas vidas. Ele é a nossa saúde e a nossa salvação. Em nome do Pai e do Filho e do Espírito Santo. Amém.

+ Dom José Francisco Rezende Dias

Arcebispo Eleito de Niterói



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