A VOZ DO PASTOR – MARÇO 2019

Publicado em 01/03/2019 | Categoria: A Voz do Pastor Notícias |


 

 

FRATERNIDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS

Irmãs e irmãos, queridos de Deus:

“Serás libertado pelo direito e pela justiça (Is 1,27)”.

O tema da mensagem para o 52º Dia Mundial da Paz havia sido “A boa política está a serviço da paz”. Naquele mês, comentávamos que a responsabilidade política pertence a todo cidadão. Não há paz sem confiança recíproca. Já naquele mês, lembrávamos o quanto a política é um tema espinhoso.

Agora, a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil, buscando estimular a participação de todos nas Políticas Públicas, à luz da Palavra de Deus e da Doutrina Social da Igreja, lança a Campanha da Fraternidade 2019, para fortalecer a cidadania e o bem comum, mas sobretudo a fraternidade, aquele bálsamo perfumado que canta o salmista.

“Como é bom, como é suave, viver todos juntos como irmãos. É como um bálsamo precioso que se derrama sobre a cabeça, e desce sobre a barba de Aarão” (Salmo 133). A Campanha da Fraternidade procura essa harmonia entre os irmãos.

A CF começa no dia 6 de março. O tema é “Fraternidade e Políticas Públicas” e o lema: “Serás libertado pelo direito e pela Justiça”. Neste ano, a Igreja e a Sociedade irão conhecer e discutir como são formuladas e aplicadas as Políticas Públicas pelo Estado brasileiro.

É preciso tomar conhecimento do que é o poder público, dos tipos de poder e os condicionantes nas políticas públicas e do papel dos atores sociais nas Políticas Públicas. Só há um país quando a sociedade participa e protagoniza o controle social das Políticas Públicas. Política Pública não é somente ação do governo, mas a relação entre as instituições e os diversos atores envolvidos na solução de seus problemas. É preciso que haja princípios, critérios e procedimentos, e que eles resultem em ações, projetos ou programas, a fim de garantir à sociedade os seus direitos.

“Serás libertado pelo direito e pela justiça (Is 1,27)”.

Ao mesmo tempo, celebramos a Quaresma, o tempo mais rico do Ano Litúrgico, o tempo em que preparamos a eternidade da Páscoa. São imensamente ricos os textos e a caminhada da liturgia, neste Ano C.

No 1º Domingo da Quaresma, seremos guiados pelo Espírito ao deserto. Lá, naquele ambiente hostil – qual ambiente não o é? – seremos expostos ao antigo inimigo, e teremos de estar prontos para responder a ele, com inteligência e sutileza, porque ele é inteligente e sutil. Como é!

No 2º Domingo da Quaresma, não estaremos mais na secura do deserto, expostos ao enfrentamento do inimigo, mas no monte da transfiguração, expostos à luz de Deus. De um ambiente para o outro, de um domingo para o outro, mudamos consideravelmente de companhia. Quem não tomaria para si as palavras de Pedro? “Mestre, como é bom estarmos aqui”.  Pedro não sabia o que estava dizendo. Mas nós, depois de tudo o que andamos passando, não é possível que não saibamos que aquelas mesmas palavras traduzem o nosso desejo de luz, sempre mais luz.

O 3º Domingo da Quaresma é exigente: nos coloca frente a frente com nós mesmos. Que figueira somos nós? Que frutos proporcionamos à sociedade, ao bairro, à nossa casa? Não queremos ser cortados, não queremos inutilizar a terra. Só temos uma chance. E não podemos perdê-la.

O 4º Domingo da Quaresma nos afasta, definitivamente, da aridez das figueiras bravas e nos coloca nos braços do Pai. São maravilhosos os contrapontos: aridez no deserto e luz no Monte Tabor, aridez da figueira brava e o colo do Pai, daquele pai à espera da volta do filho.

Quando chegarmos ao 5º Domingo da Quaresma, estaremos, de novo, frente a frente com nós mesmos, mas então na figura de uma mulher, surpreendida em flagrante adultério – como diz o texto. Nada sabemos daquela mulher. Seria alguém desiludida com a própria vida? Teria sido enganada por algum sedutor? Nada sabemos dos homens, nem do adúltero, nem do marido. O que sabemos é que “Ninguém te condenou?… Eu também não te condeno”. Quantas vezes daríamos um pedaço de vida para ouvir essas palavras redentoras proferidas direto ao nosso coração.

Que caminhada! Que riqueza de conteúdo!

Há séculos, a liturgia vem sendo preparada, modificada, transfigurada no Rosto do Senhor. Na Quaresma de 2019, estaremos colhendo os frutos de tantos que nos antecederam, numa caminhada que agora é a nossa. Assim como só eles puderam fazer o próprio caminho, só nós podemos refazer o nosso. Que nesta Quaresma o nosso lugar não fique vazio!

Quando a Páscoa chegar, quando a luz brilhar com mais intensidade do que no primeiro dia da Criação, quando Deus enxugar todo pranto e retirar o véu de luto e o manto de dor, descobriremos que avançamos além de Isaías. “Serás libertado pelo direito e pela justiça (Is 1,27)”. Sim. Mas, sobretudo, pela misericórdia.

Seremos libertados pela misericórdia.

Rezemos a Oração da Campanha da Fraternidade 2019 com o olhar do pai que esfolou os cotovelos, à janela, de tanto esperar o filho voltar. Ele é o mesmo Pai que nos espera, com roupas novas, anel nos dedos e sandálias nos pés. Não há nada a temer quando se tem um Pai assim.

Pai misericordioso e compassivo,

que governais o mundo com justiça e amor,

dai-nos um coração sábio para reconhecer a presença do vosso Reino entre nós.

Em sua grande misericórdia, Jesus, o Filho amado,

habitando entre nós testemunhou o vosso infinito amor

e anunciou o Evangelho da fraternidade e da paz.

Seu exemplo nos ensine a acolher os pobres e marginalizados,

nossos irmãos e irmãs com políticas públicas justas,

e sejamos construtores de uma sociedade humana e solidária.

O divino Espírito acenda em nossa Igreja a caridade sincera e o amor fraterno;

a honestidade e o direito resplandeçam em nossa sociedade

e sejamos verdadeiros cidadãos do “novo céu e da nova terra”

Amém!

Meu irmão, minha irmã,

Que a Virgem das Dores nos acompanhe e se torne a Mãe da Alegria.

Que a minha bênção alcance suas necessidades espirituais e materiais.

Que esta caminhada nos leve ao encontro do Cristo resplandecente, que brilha acima de nossos desertos, de nossas figueiras estéreis e de nossas misérias.

Que lá na frente nos encontremos, além do Monte Tabor, à beira de um túmulo vazio, boquiabertos e contemplativos, diante do Mistério que nos supera e nos aguarda. Amém.

+ Dom José Francisco Rezende Dias
Arcebispo Metropolitano de Niterói

 


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